logar-se AFAPC no Facebook

PEC 51 - Duas Reflexões

PEC 51 - Duas Reflexões

03/12/2013

PEC 51 – E A CRISE DOS MODELOS
DE POLÍCIA NO BRASIL

Uma das grandes antinomias do pensamento moderno, muito comum nas organizações policiais, é que polícia não deve misturar-se com política. Muito engraçado este mito.  Ele foi fortalecido e repetido infinitas vezes na República brasileira durante a fase da “democracia institucional” pós-regimes militares e autoritários. 
O mais demoníaco desta premissa é que a composição das organizações policiais edificado pela Constituição de 1988 no art. 144 manteve todas as prerrogativas do Estado autoritário, bem como os privilégios das cúpulas das polícias.
Consolidou-se, portanto, nas organizações de segurança pública um verdadeiro apartheid policial entre as carreiras e a lógica patrimonialista das relações intra corporis, que segundo o dito popular afirma: “manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Este é o preceito que se apresenta em todas as organizações verticalizadas indistintamente, passando pela Polícia Federal, pelas Policias Civis e pelas Polícias Militares.
Os princípios meritocráticos e a própria concepção de democracia enquanto valor universal são relativizados em tais organizações. O que se reproduz de forma hegemônica, é uma visão “salvacionista” do policial-herói autoritária, escravista, elitista. Herança distintiva de nossa herança colonial e republicana, marcada pela exclusão e pela alienação do povo brasileiro, que deveria ser vigiado e controlado como gado em confinamento.  Passados 27 anos de governos civis, o fantasma da ditadura autoritária insiste em se manter na formação dos “aparelhos repressivos” do Estado.  Até quando manter esta estrutura que insiste em vitimizar a sociedade civil brasileira e os próprios agentes que a compõe, convertidos hoje em cidadãos de segunda classe?
A PEC 51/2013, em linhas gerais, é uma proposta modesta e até conservadora, pois não propõe mudanças no procedimento inquisitivo das organizações como os inquéritos policiais.  Sua orientação, no entanto, apresenta algumas inovações: a criação de uma polícia estadual de ciclo completo, a conversão das guardas municipais para polícias, e a desmilitarização e a criação de uma carreira única para todos os policiais. Os estados teriam um período de 06 anos para fazer esta transição.
Como o Prof. Jorge Zaverrucha já havia insistido por diversas vezes, a militarização das polícias não é exclusividade das polícias militares. Encontramos a lógica autoritária e taylorizada, com a separação entre a reflexão e a ação, também nas Polícias Civis, que recorrentemente adotam posturas e organizações paramilitares em seus quadros. E até as Guardas municipais estão sendo vitimizadas por este modelo.
Portanto, a PEC 51, longe de ser uma solução definitiva para as antinomias da segurança pública, pode ser considerada um bom começo. Os movimentos contestatórios no Brasil colocaram a prova o anacronismo nas polícias em controlar distúrbios sociais e suas ações de repressão e indiciamento.  À medida que os agentes de segurança pública se politizam e se organizam institucionalmente, começam a experimentar a democracia, começam a entender que a função da polícia muito mais do que proteger o Estado e o Establishment. Sua missão primordial é defender a democracia e a sociedade e a paz social.

Autor: Vladimir Luís de Oliveira

Desmilitarizar: Uma questão de cidadania

Com certeza desmilitarizar a polícia não se trata de estética. Não se tratam da quebra da hierarquia nem da disciplina, elementos tão caros aos defensores do militarismo. Como se somente nestas instituições isso estivesse presente. Trata-se antes de qualquer coisa, de construir uma segurança pública mais democrática e mais eficiente. O modelo atual já está amplamente desgastado e demonstra suas falhas, que são crônicas. Revela-se a cada dia mais inapropriado e incapaz de atender aos anseios da sociedade. Descortinou-se a sua real função histórica, mas que definitivamente não pode mais ser tolerada. Desmilitarizar é ampliar direitos, é incluir uma parcela da sociedade no arcabouço de benefícios trabalhistas, é produzir justiça a uma categoria de trabalhadores que tem uma obrigação e uma responsabilidade muito grande, é transformar o policial em cidadão, é tornar profissional de fato o serviço da segurança pública brasileira, é democratizar.  Deve ser também retirar privilégios daqueles que não são policiais de verdade, mas que controlam o sistema como empresas familiares e mantém seus negócios cada dia mais lucrativos.
Como atribuir a um indivíduo a “categoria de profissional” se este não tem nem mesmo alguns dos direitos mais elementares de um cidadão? O que podemos esperar de “profissionais” que não dispõem de liberdade de expressão e não podem participar amplamente da vida política do país? O que podemos esperar de indivíduos presos a um regulamento obsoleto feito para casos de exceção, onde se supõem a necessidade de uma obediência cega e que não seja possível questionamento em nome de uma ação que se pretende coletiva, portanto, maior do que o indivíduo obrigado a sacrificar sua liberdade e individualidade em prol da maioria? Contudo, não seria justo atribuir a violência policial somente à falta de direitos dos policiais, mas não podemos negar os efeitos desta forma de tratamento aos militares, que sem dúvida reproduzem uma violência sofrida nos quartéis, no seu dia-dia nas ruas. Somado a tudo isso temos instituições historicamente organizadas para garantir a propriedade privada. Que nunca estiveram perto da sociedade e do cidadão e sim de frente, como uma barreira de proteção a uma classe privilegiada, como um anteparo contra a ascensão da massa despossuída. Negar estes fatos é ignorar alguns dos elementos mais importantes na discussão sobre a segurança pública. O militar também é um ser humano e pertence à sociedade, ao povo. Como tal, sofre a maioria das amarguras que o povo sofre sem poder se manifestar livremente. É preciso avançar, é preciso mais. A sociedade clama por uma polícia mais humana e competente, que acompanhe o desenvolvimento das instituições democráticas e o crescimento do país. Os policiais clamam por melhores condições, tratamento mais humano, justo e verdadeira valorização pelos serviços prestados, e não medalhas. Eles que fiquem com as medalhas! Não é apenas cultural, é também a estrutura, sua forma e funcionamento que produzem em grande parte os absurdos da segurança pública nacional. Desmilitarizar é mais do que uma simples escolha da sociedade ou de uma categoria de “trabalhadores”, é uma necessidade ao fortalecimento e desenvolvimento da democracia Brasileira.

www.sipolparana.com.br

<<  voltar à notícias